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Política fiscal, um fôlego em meio ao caos

Atualizado: 22 de abr. de 2020

Este relatório consiste numa análise das políticas ficais adotadas em meio a pandemia causada pela Covid-19. Após uma breve contextualização do cenário atual, o objetivo deste texto é apresentar algumas das medidas tomadas pelas autoridades, além de expor um panorama futuro para o cenário nacional.


 

Contextualização


A pandemia da Covid-19, causou um inesperado choque econômico, este por sua vez teve efeitos tanto na demanda quanto na oferta mundial. Ao atingir a economia com estes dois tipos de choques, criou-se no mundo a expectativa de desaceleração global por vários meses. Com base na heurística de aversão a risco, os investidores tornaram-se mais cautelosos, levando ações e títulos a serem reprecificados de maneira abrupta, o que pode ser evidenciado ao longo do mês de março após 6 circuit breakers.


Ao analisar o lado da oferta, percebe-se que a capacidade de produção global foi diminuída, em especial na China, devido a paralisação de várias fábricas e da presença dos trabalhadores em casa. A primeira impressão era que este choque de oferta poderia ser resolvido no curto prazo, seguindo uma recuperação em “V”, pois com o vírus sob controle, a produção retomaria a seu nível natural.


No decorrer das semanas, as projeções inicias foram alteradas, pois o lado da demanda também demonstrou queda. A presença do vírus levou as pessoas a retraírem o consumo em bens considerados não essenciais, diminuindo hábitos como o de viajar e o de comer fora. Isso afetou diretamente o fluxo trabalhisco da sociedade; nos EUA por exemplo, 22 milhões de pessoas solicitaram auxílio desemprego no mês de março, pois milhares de empresas passaram a demitir e deixaram de contratar, ao invés de conceder folga, o que elevou ainda mais o impacto na demanda agregada.


Quando comparado a crises passadas, a combinação destes dois choques é considerada um fenômeno raro. Com isso, seus possíveis efeitos não são consenso. Todavia, como medida a fim de suprir a falta de demanda, foi atribuído aos bancos centrais e aos governos a incumbência de fazer ajustes necessários para a economia continuar a funcionar; e sobre essas obrigações do governo que iremos mais afundo neste relatório.


Políticas em meio a Covid-19


1. A relação entre a política fiscal e monetária


Ao enfrentar situações de crise como esta, o gestor de política pode recorrer a dois tipos de medidas anticíclicas para tentar mitigar os efeitos sobre sua economia; (I) políticas monetárias, que podem ser rapidamente aprovadas pelo Copom, são usadas como amortecedora de impactos sob o sistema financeiro, e apresentam considerável defasagem temporal até ter efeitos reais na economia; (II) políticas fiscais, que tendem a ter tempo de aprovação mais longo, devido a necessidade de aprovação dos parlamentares no congresso, mas seus efeitos são evidenciados na economia de forma quase imediata.


Devido a tendência expansionista de política monetária, é valido ressaltar que em consequência dos sucessivos cortes na taxa Selic, novos movimentos por parte do Copom poderiam levar a taxa de juros a níveis baixíssimos, equiparando-se a taxa de economias desenvolvidas. E em detrimento disso, propiciaria fuga de capital; fato que neste momento se contrapõe a ideia do governo de prover liquidez ao mercado. Por isso, manteremos o foco no lado fiscal, afinal este é o método mais usado nos países, estando incluso o Brasil, para tentar minimizar os impactos do coronavírus na economia.


2. Analisando a participação do governo


Como observado nos últimos dias, o número de infectados pela Covid-19 vem crescendo, e as prioridades das medidas adotadas pelo governo se dividem em: salvar vidas e reduzir o impacto sobre os empregos e a renda das famílias. Neste contexto focaremos no lado econômico da situação, explicitando algumas das medidas tomadas pelo governo até o momento.


De acordo com as projeções do secretário da Fazenda, Waldery Rodrigues, antes do vírus afetar a economia nacional, a meta governamental para 2020, vista como otimista, era de um déficit primário próximo a R$ 124 bilhões, em função da redução das taxas de juros e as receitas maiores, que seriam impulsionadas pela possíveis reformas a serem aprovadas.


Ao analisar os números recentes divulgados pelo governo, nota-se que o custo das medidas de estímulo à economia e de combate à pandemia estão se aproximando de R$ 1 trilhão, este seria o maior pacote de auxílio já anunciado pelo governo brasileiro em situações semelhantes. Segundo a última atualização do ministro da Economia, Paulo Guedes, o déficit já é superior a R$ 419 bilhões. Com isso, o tamanho do rombo causado pelos pacotes de combate a crise, já está próximo a 6% do Produto Interno Bruto (PIB).


3. Exposição das medidas adotadas


No gráfico 1, está exposto a alocação das medidas fiscais mais comuns em setores não sanitários no mundo. Ao trazer essa análise pro cenário interno, as principais distribuições incluem o apoio na renda das famílias vulneráveis (como antecipação do 13° pago aos aposentados, expansão do Bolsa Família pago a mais de 1 milhão de beneficiários, transferência de R$ 600 para trabalhadores informais e desempregados), além do apoio ao emprego (como remuneração parcial a trabalhadores temporariamente suspensos ou com redução do horário de trabalho) e garantia de impostos e contribuições mais baixos. Todas medidas acima tiveram o objetivo de manter a liquidez da economia e garantir a renda mínima dos trabalhadores.



3.1. Panorama fiscal internacional


É interessante avaliar que nas condições desta crise, países desenvolvidos abdicaram das políticas de austeridade e usaram de métodos fiscais para tentar absorver os impactos dos choques globais. Como já era esperado e demonstrado no gráfico 2, estes países gastaram menos recursos que os países emergentes, em suma, pela menor dependência que a média dos agentes nacionais tem do governo, pois muitos destes conseguem poupar, além das firmas também serem mais saudáveis; e isto, facilita a situação para o policy maker em momentos de crise como este. O Reino Unido, por exemplo, ofereceu cobertura de até 80% do salário de quem está impedido de trabalhar. E os EUA propuseram transferência de US$1200 para maioria dos cidadãos. Mesmo governos liberais têm defendido programas de renda mínima, que além de proteção social oferecem estímulos à demanda no pós-crise.



4. Orçamento de Guerra


Explorando mais afundo a questão fiscal, um ponto que merece destaque é a PEC referente ao Orçamento de Guerra. Até o momento a emenda constitucional ainda está em processo de aprovação em Brasília; e sua aplicação visa garantir agilidade na disponibilização de verba federal para o atendimento às vítimas e fornecer suporte às obras e serviços durante o estado de calamidade pública. Entretanto, esta medida criaria um regime extraordinário, que flexibilizaria a execução orçamentária de medidas emergenciais, em detrimento do controle e da fiscalização de órgãos e dispositivos públicos, incluindo a suspensão da Regra de Ouro, norma a qual impede o governo federal de contrair dívida para cobrir os gastos correntes.


Após a apresentação desta medida agressiva, a dúvida que pode surgir é: o risco de adotar uma política tão permissiva e que pode trazer sérias consequências a economia nacional no futuro é válido?


Ao comparar a crise atual com a do Subprime, nota-se que em 2008 o setor mais afetado foi o bancário, e que através de políticas de flexibilização orçamentária e garantias de liquidez pode ser solucionado majoritariamente pelo lado monetário. Contudo, pelo momento atual se tratar de uma crise que impacta diretamente o lado real da economia, medidas monetárias não são tão eficazes, além das outras razões já explicadas anteriormente. Visto isso, resta ao governo adotar medidas agressivas, como a aprovação da PEC intitulada como Orçamento de Guerra, que conforme estimado no gráfico 4, impulsionará um déficit recorde no ano de 2020.



Panorama futuro


1. Déficit e a importância das reformas


Ao tentar consolidar as informações apresentadas e traçar cenários com os possíveis impactos na economia, uma situação complexa surge. Como já apresentado, no curto prazo o governo tem dentre as metas, garantir a manutenção de empresas e renda das famílias durante o período de crise, por meio do uso demasiado da política fiscal. E assim como na física, neste caso, uma ação também gera uma reação. O uso excessivo de métodos fiscais expansionistas, incorre num aumento do déficit primário.


Como exposto no gráfico 5, o Brasil já apresentava um significativo déficit, o qual almejava reduzir por meio das reformas tributária e administrativa. Também deve se levar em conta, que devido a situação atual, a agenda de reformas está parada, o que vai impactar ainda mais nas contas públicas. Estas reformas têm como objetivo reduzir as tendências históricas de alta do país. Com isso, no cenário pós-crise, a tendência é que o déficit primário cresça mais, e se as reformas já eram essenciais antes da crise, agora elas passam a ser ainda mais relevantes.



2. Indefinições e incertezas


Como de praxe ao tentar fazer projeções econômicas, pouco pode ser de fato afirmado, pois como na maioria dos casos, o resultado final varia em função de uma incógnita ou fator desconhecido no momento da análise, e que neste caso, será o tempo.


As consequências econômicas no pós-crise dependem em parte de quanto tempo o lockdown perdurará. Economistas ao analisarem as consequências das políticas usadas no passado e replicando as no futuro, puderam traçar dois cenários, um de curto-prazo, o qual o distanciamento social dura aproximadamente mais um mês e gera queda de mais 0,4% no PIB, causando efeitos considerados temporários sobre a economia.

E outro cenário ocorreria, caso a quarentena fosse estendida por mais de dois meses, obrigando governo federal a tomar contínuas medidas agressivas, gerando uma perda de mais 1,8% do PIB. Com essa medidas de longo prazo, uma consequência que merece destaque é a possibilidade do deslocamento da curva de juros para cima, que somada ao desequilíbrio fiscal, incorreria numa dificuldade a mais para o governo pagar as dívidas que vem realizando, e isso pode originar outros problemas, como aumento no risco de calote e evasão de investimentos externos.


Caso a situação de confinamento se estenda, é válido reiterar que as medidas tomadas no curto prazo terão sérias consequências no futuro. Assim, a sinalização de projetos e reformas focados na austeridade devem estar sob o radar dos ministros e deputados desde agora. Pois as mesmas medidas fiscais que estabilizam a economia no caos atual instaurado pela pandemia, serão as responsáveis por possível caos em escala maior no futuro, já que pode demorar anos ou até mesmo décadas para serem sanados.


 

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