No noticiário, temos diversos termos econômicos que, à primeira vista, parecem complexos e difíceis de entender. Muito mais complicado parece ser a relação entre eles. Temos, também, um trio que sempre se repete nesse meio, a saber: a taxa de juros, o câmbio e a inflação. Entendê-los é de vital importância para a compreensão do que está acontecendo tanto no cenário econômico quanto no político, devido ao aparecimento do covid-19.
Taxa de Juros
A Taxa de Juros é a compensação ganha por manter uma parte da renda emprestada ou investida e não consumida.
A taxa básica de juros brasileira que guia todas as outras é a Taxa Selic. Sua meta é definida pelo COPOM, com o objetivo de realizar alguma política monetária. Isso é possível pois a Selic define a rentabilidade dos títulos indexados a ela. Com isso, geram-se efeitos interessantes de se observar, como veremos a seguir.
Um deles é o controle sobre os juros que serão cobrados pelos bancos. Como a alteração da Selic altera também uma parte do custo de captação dos bancos, estes podem repassar a variação para os clientes reduzindo ou ampliando os juros cobrados a eles.
No cenário externo de até então desaceleração do crescimento global, as taxas de juros dos vários bancos centrais já se encontravam em patamares baixos. Esse cenário mais dovish também condicionou internamente a eventual redução gradual da nossa taxa de juros. Essa passou de 14,25% em outubro de 2016 para 4,5% em janeiro de 2020. Com os efeitos gerados e esperados pelo lockdown imposto após a chegada do Covid-19, espera-se em suma a redução de demanda agregada. A partir dessa redução de consumo, devido ao fato das pessoas tenderem dispor de menor renda para gastos não essenciais, o COPOM optou por reduzir a taxa básica para 3,75%, o que, considerando a meta de inflação (4%), reduz o ganho real, isto é, a taxa básica de juros real, para menos que 1%, pela primeira vez na história.
Outro fator a ser considerado quanto a esse assunto são as taxas de juros internacionais. A mais importante é a imposta pelo FED (Federal Reserve System), dos EUA, a Fed Funds Rates, que em março foi para 0,25%. Essa taxa é importante pois a comparação entre ela e a Selic é um dos fatores que podem determinar se haverá ou não fuga de capitais e, com isso, a variação da taxa de câmbio e da inflação.
Câmbio
No dia 16 de março de 2020, pela primeira vez na história do Real, o valor da taxa foi acima de R$ 5,00 por dólar. A tendência de alta vem ocorrendo desde o final de dezembro de 2019, depois de quase 2 anos variando em torno de US$ 3,80.
Anteriormente, a taxa de câmbio já estava aumentando devido a Guerra Comercial entre China e EUA. O que explica isso é que em um ambiente de incerteza no mercado internacional, os investidores tendem a procurar ativos mais seguros e líquidos, sendo o mais representativo deles o dólar. Isso provoca nos países emergentes uma desvalorização da moeda frente ao dólar devido a fuga de capitais.
Para os exportadores, como JBS, BRF e Vale, essa depreciação cambial influi de algumas maneiras positivas. Isto porque seus produtos podem ficar mais baratos comparados aos competidores internacionais, portanto, mais competitivos no mercado. Até o começo do ano, era possível que este cenário se concretizasse, mas devido à pandemia que reduziu o consumo global, houve junto ao aumento do dólar, uma redução da demanda pelas exportações. Como eles representam uma boa parte da troca de dólar por real, a redução de suas vendas também representa a redução do contrafluxo que determinava o equilíbrio da balança comercial. Menos exportadores com dólares, menos dólares disponíveis no mercado de câmbio para a troca com o real, então a moeda norte-americana tende a ficar mais valorizada.
Já os importadores, como Nissan, LG e Volkswagen, terão que lidar com a redução da demanda interna, devido à queda de renda das pessoas, fechamento de comércios, elevado grau de falência de companhias e etc. Porém, se por um lado a demanda tende a cair, seus custos também tendem a se elevar, visto a desvalorização do câmbio para seus insumos e seus próprios produtos. Logo, esse setor verá sua margem de lucro ainda mais espremida.
Para evitar ou contornar maiores problemas que podem advir da variação do câmbio, que vem sendo causado por fatores externos, como a instabilidade no comércio internacional devido a guerra comercial, o governo intervém no mercado cambial, comprando ou vendendo dólares. Esta medida visa estabilizar a taxa a ponto que não prejudique os importadores nem os exportadores. Isso chama-se câmbio flutuante sujo. Foi o que ocorreu no primeiro quaternário de 2020, onde o BACEN vendeu 25,339 bilhões de dólares das reservas internacionais do país. Ao longo de 2019, ele vinha deixando a taxa chegar até em torno de 4,25 R$/US$, e então intervinha. No começo de 2020, o banco pouco interviu para evitar a elevação do dólar, o que fez o mercado especular se o BACEN estaria determinando algum tipo de patamar para a moeda estrangeira.
Um detalhe a ser notado é que o Real vem se desvalorizando mais que a maior parte das moedas emergentes frente ao dólar. Um dos motivos que deve ser apontado é a alta participação e importância na Bolsa de empresas de petróleo e mineração. Juntas, Vale e Petrobras representam grande parte da movimentação nela e quase 20% do valor do Ibovespa. Com a variação do preço do barril de petróleo, de US$ 57,50 para US$ 27,00 e a variação do preço do minério (Gráfico 3), que tende a cair devido à desaceleração econômica chinesa, os investidores ficam mais céticos quanto a futura rentabilidade e preferem vender essas ações. Junto à preferência pela liquidez em momentos de crise, essa situação aumenta a procura por dólares.
Deflação?
Como estamos numa crise de demanda, existe uma tendência natural a deflação. Como um dos aspectos que interfere na inflação e na deflação é a demanda por produtos, o enclausuramento, o fechamento de lojas e o desemprego causado por isso podem vir a provocar o efeito de diminuição das vendas.
Segundo o último relatório Focus, a expectativa é que a inflação deve continuar abaixo da meta, de 4%, pelo próximo ano, o que indica a confiança dos agentes econômicos que os fatores que levam a inflação serão fortemente contrabalanceados pelos fatores que causam a deflação. E o fator mais importante a ser observado nesse período é justamente estas expectativas, pois, baseados nelas, as empresas definem seus contratos de longo prazo. E as expectativas dependem diretamente de como será o desenvolvimento da doença no mundo e o comportamento do preço do petróleo.
Com a atual disputa entre Rússia e Arábia Saudita e devido a isso, a variação do preço do barril de petróleo, de US$ 57,50 para US$ 27,00, existe a expectativa de redução duradoura do preço do combustível nas bombas. Não somente por este embate, mas também, porque os estoques globais de petróleo estão altos, e a demanda por esta commodity com a desaceleração global também tende a cair. Isso pode contrabalancear a tendência altista em cima dos bens de consumo essenciais como, alimentos e fármacos pois, como o transporte de bens e pessoas é no Brasil feito em maior parte através das rodovias, a redução do preço do combustível reduz o preço de transportes, e isso pode segurar o aumento dos preços finais dessas mercadorias.
Outro fator que pode colaborar para reduzir tendências altistas de preço é o pass through cambial. A partir da leitura anterior que fizemos, apesar do real depreciado, a demanda global por commodities está menos acentuada, quando nos referimos a bens de consumo essenciais e commodities no geral, o pass through segue o racional de que, quando um bem está muito competitivo no exterior, a demanda do consumidor externo é alta, e assim, atua competindo em preço com o consumidor interno. Contudo, como entendemos uma menor aderência global a commodities, entendemos também que o efeito de pass through atua em menor intensidade na economia, logo, não colaborando para uma tendência altista, por hora.
Se a inflação diminui, a Taxa de Juros Real aumenta. Isso pode ser estendido a todas as taxas, inclusive a Selic, como dito acima. Então, essa redução tem efeito similar a um aumento da Selic, no sentido de que representa ganho de rendimentos aos investidores estrangeiros e pode vir a causar o efeito de entrada de capital por partes deles.
Portanto, se a Selic diminuir assim como a inflação, poderíamos observar uma manutenção de capitais estrangeiros nos próximos períodos, isto se, a redução da Selic for próxima de compensar a redução da inflação, a taxa de juros real permaneceria no mesmo patamar. Ao contrário disso, se tivéssemos um aumento de inflação, teríamos a potencialização de saída de capitais. Esse fato foi observado entre o final do ano passado e o começo deste, em que, entre outubro e dezembro, tivemos uma redução de 0.5 p.p. da Selic e um aumento de 1,77 p.p. no IPCA, o que resultou, neste período, em uma série quase ininterrupta de saídas de capitais, chegando a menos 16 bilhões de reais no dia 2 de janeiro.
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